O defensor público é um advogado? Quais são as diferenças?
Defensor público é advogado? Esta é uma questão que corriqueiramente provoca polêmica no meio jurídico. Popularmente, os defensores públicos são conhecidos como “os advogados fornecidos pelo Estado”. Embora haja verdade nessa afirmação, uma vez que as duas atividades se assemelham em muitos pontos, tecnicamente ela não é correta.
Além das similaridades, existem também muitas diferenças entre as duas carreiras. Elas são de natureza constitucional, institucional e de prerrogativas. Veremos mais adiante, em detalhes, quais são essas principais distinções que nos permitem afirmar que o defensor público não é um advogado.
Essa polêmica, inclusive, já foi solucionada pela jurisprudência. Em julgamento do Recurso Especial Nº 1.710.155/CE, em 2018, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu a favor de desnecessidade de inscrição de Defensoras e Defensores Públicos na Ordem dos Advogados do Brasil.
“Em conclusão, o art. 3º, § 1º, da Lei 8.906/1994 merece interpretação conforme à Constituição para obstar a necessidade de inscrição na OAB dos membros das carreiras da Defensoria Pública, não obstante se exija a inscrição do candidato em concurso público. Ademais, a inscrição obrigatória não pode ter fundamento nesse comando em razão do posterior e específico dispositivo presente no art. 4º, § 6º, da Lei Complementar 80/1994.”
Com isso, podemos estabelecer com mais objetividade as diferenças entre as duas carreiras, conferindo que defensor público não é advogado:
Natureza constitucional
As funções da Defensoria Pública e da advocacia privada são descritas em momentos distintos na Constituição Federal. O artigo 134 afirma ser a Defensoria Pública “instituição essencial à função jurisdicional do Estado”.
Já o artigo 133 define o advogado como “indispensável à administração da justiça”.
Ou seja, em sua gênese constitucional, as duas carreiras são descritas por artigos distintos.
Atuação
Em que pese prestarem serviços de advocacia contenciosa, os defensores públicos não advogam para clientes, mas sim defensoram para seus assistidos. São funcionários públicos, remunerados pelo Estado, com ônus e bônus desse status. Alguns exemplos: eles têm estabilidade na carreira, sua atuação dispensa contrato de mandato, não podem escolher em quais demandas atuar (indeclinabilidade das causas) e não podem receber honorários advocatícios.
Por outro lado, a atuação dos advogados privados é livre, e sua relação com os clientes é de natureza privada. Eles podem escolher quais demandas patrocinar, têm liberdade de contratação, recebem honorários advocatícios e precisam que o cliente firme procuração para prática de atos necessários à devida representação.
Sujeição
Os advogados privados se sujeitam ao Código de Ética do Estatuto da OAB (Lei 8.906/04).
Já os defensores públicos estão sujeitos às regras do regime jurídico diferenciado dos servidores públicos e à Corregedoria-geral da Defensoria Pública.
Atribuições
Outra diferença entre defensor público e advogado está na legitimidade de o primeiro propor ações coletivas, como a ação civil pública, visando a proteção dos interesses de uma classe ou grupo de pessoas. Esse tipo de atribuição não cabe ao advogado particular.
Também podemos citar a atribuição da Defensoria Pública de visitar periodicamente os estabelecimentos penais, participando ainda dos Conselhos Penitenciários, com direito a voz e voto. Essa função é garantida pela Lei de Execução Penal (Lei 7.210/84), e não se estende à advocacia privada.
Prerrogativas
Há diferenças entre o defensor público e o advogado também nas prerrogativas processuais. Para os primeiros, a intimação dos atos é pessoal, e a contagem dos prazos é em dobro. Eles também contam com poder de requisição, possibilitando requisitar de autoridade pública documentos, informações e esclarecimentos necessários às suas atribuições.
Para os advogados, a intimação é feita por Diário Oficial de Justiça, e a contagem dos prazos é normal. Tampouco possuem o poder de requisição.
Conclusão
Embora sejam duas carreiras semelhantes, que exercem parte das mesmas atribuições, não é possível afirmar que um defensor público é advogado. O próprio STJ já pacificou a questão, ao julgar um recurso extraordinário que desobriga que os defensores públicos concursados estejam inscritos na OAB. Por mais que sejam parecidas, as duas profissões guardam importantes diferenças, que as tornam únicas, embora sejam essenciais para a essenciais para a atividade jurisdicional.